Bon Iver no Campo Pequeno da cidade do amor

Bon Iver no Campo Pequeno

Os Bon Iver regressaram a Lisboa pouco mais de três meses depois de se terem estreado por cá com um concerto perfeito no Coliseu. Um Campo Pequeno praticamente lotado foi o local escolhido pela banda para regressar aos palcos, depois de mais de um mês de paragem.

Vi-os pela primeira vez em Paris há um ano e novamente em Lisboa no concerto de julho, com duas grandes diferenças: o público e “Re: Stacks”. Em Paris, tinha sido quase perfeito. Mas Lisboa deu-nos a perfeição.

E foi com expetativas deste nível que eles regressaram a Lisboa. Por um lado, podia ser que tivessem o público rendido à espera deles. Por outro, é possível que estivéssemos todos justificadamente exigentes. Mas que se lixe. A partir do momento em que “Perth” começou a soar, esquecemo-nos disso.

Os Bon Iver são gigantes. Com nove músicos em palco a tocar tudo e mais um par de botas, o som é inevitavelmente grandioso. E não me refiro só às canções obviamente gigantes, como a já referida “Perth” ou “Minnesota, WI”. É em temas como “Hinnom, TX” ou “Brackett, WI” que se nota mais a dimensão dos Bon Iver ao vivo.

Mas, num concerto de Bon Iver, não falar das óbvias era deixar de parte para aí dois terços do espetáculo. Tivemos “Towers”, a perda da virgindade e a notícia de que Lisboa é a cidade do amor para Justin Vernon. Tivemos a belíssima “Holocene”, tivemos o saxofonista Colin Stetson a construir uma ponte sonora e tivemos, como sempre (estamos a ficar mal habituados), a enorme “Blood Bank”. A versão de estúdio da canção é maravilhosa e eu adoro-a de morte. Mas ao vivo é outra coisa. Com todas as guitarras do mundo, o que perde em subtileza, ganha em força bruta daquela que nos deixa com amnésia. (Por falar em força bruta, devíamos dar uma cabeçada coletiva à Sagres por colocar os tipos da cerveja a passear no meio do público durante o concerto. Estúpidos de merda.)

Enquanto Colin Stetson fazia a cama para a entrada de “Blood Bank”, já eu pensava numa coisa só: “Re: Stacks”. Porquê? Porque o lugar dela na setlist é a seguir à “Blood Bank”, normalmente. E nem sempre aparece. E é a minha música favorita deles. Em boa verdade, já pensava no assunto desde uns dias antes – por terem tocado a canção no Coliseu pensei que pudessem deixá-la de fora desta vez. Felizmente, não aconteceu. “Re: Stacks” ressoou pelo Campo Pequeno e, durante esses 6 ou 7 minutos, é como se eu lá estivesse estado sozinho.

E depois começou o final do concerto, se é que posso pôr as coisas nestes termos. “Skinny Love” abriu o apetite (e as goelas), “Calgary” deu-nos o sinal de que, tal como em quase todos os outros espetáculos de Bon Iver desde que lançaram Bon Iver, Bon Iver, o set principal estava quase a terminar. E fê-lo, como sempre, com distinção. Depois, “Lisbon, OH” deixou-nos descansar um bocado.

Descansar para quê? Para “Beth/Rest”, claro. Ao vivo, esta canção parece ficar melhor de dia para dia (não fica… mas parece). Soa a foleirada dos anos 80? Soa certamente. Mas é inacreditavelmente boa. Estupidamente, mesmo. Primeiro envolve-nos com os teclados melosos enquanto nos mantém acordados com aquela tarola barulhenta. Depois… bem, depois é a desgraça total. Às tantas, já não sei onde estou. Que grande, grande forma de terminar o set principal. Nem sei o que vão fazer se lançarem um terceiro álbum…

Depois de “Beth/Rest” e antes do primeiro encore, houve pouco pouco tempo mas sempre deu para pensar em como aquele senhor barrigudo atrás de mim estava sempre demasiado perto apesar das minhas tentativas de me afastar dele (a saber: aquilo estava cheio… mas não estava assim tão cheio). E continuo a ter esperança de que aquilo fosse uma pequena mala a tiracolo.

Voltando à música, os dois encores trouxeram-nos três temas obrigatórios de For Emma, Forever Ago: “Creature Fear”, “For Emma” e, claro “The Wolves (Act I and II)”. Não há muitas palavras que possam descrever o que acontece durante a última canção… mas uma que se aproxima do objetivo é “comunhão”.

Durante a temporada tauromáquica, há touradas no Campo Pequeno todas as semanas. Mas se em vez de touros, cavalos, forcados e pessoas de famílias numerosas a assistir, tivéssemos Bon Iver num espetáculo regular ao estilo Las Vegas, podem crer que estávamos bem melhor. Aí, o epíteto de “cidade do amor” já não nos escapava mesmo. Mas por enquanto parece que vamos ter de esperar mais um bocado pelo regresso de Justin Vernon e companhia a Portugal. Talvez em 2013.