DeYarmond Edison, a pré-história de Bon Iver

Justin-Vernon

Antes de Justin Vernon nos trazer Bon Iver, houve os DeYarmond Edison.

Justin Vernon não lança um álbum novo de Bon Iver desde 2011. Na altura deu cabo de nós com Bon Iver, Bon Iver, uma obra-prima que tem resistido tão bem à passagem do tempo como a banda a lançar um novo álbum.

Quando o músico norte-americano anunciou em 2012 que os Bon Iver iam desaparecer pelo menos durante uns tempos e havia a hipótese de não voltarem, soou a despedida. Mas depois de “Heavenly Father”, canção criada em 2014 para a banda sonora do filme Wish I Was Here, e de um concerto com duas novas canções num festival criado e curado pelo próprio Justin Vernon em 2015, parece-me razoável alimentar alguma esperança.

Enquanto isso não acontece, podemos sempre ir ao baú. Antes de Bon Iver, houve os DeYarmond Edison, banda de Justin Vernon com Brad Cook, Phil Cook e Joe Westerlund, que formam atualmente os Megafaun, e Christopher Porterfield, que entretanto criou os Field Report.

Formados em Eau Claire, no Wisconsin, os DeYarmond Edison estiveram ativos entre 2002 e 2006, período em que editaram dois álbuns e um EP de despedida. O primeiro, DeYarmond Edison, toca no ponto de encontro entre o folk, a country, os blues e o rock a que se convencionou chamar de Americana e é o trabalho mais convencional da banda. É folk transformada em road trip pelo Midwest norte-americano e é um pouco como a comida feita pela mãe: confortável e aconchegante.

A voz meio crua, meio quente de Justin Vernon – longe do falsete que viria a tornar-se uma característica indissociável dos Bon Iver – contribui para dar ao álbum uma certa grandiosidade que, em teoria, seria difícil de atingir instrumentalmente em temas que navegam entre a Americana e uma folk pausada e generosa. Mas os DeYarmond Edison conseguem-no em temas como “Leave Me Wishing More”, “There Is Something” e a lindíssima “Conquistadors”.

Não se pode dizer que os DeYarmond Edison do primeiro álbum sejam particularmente originais. Aliás, é provável que parte do conforto que canções como “Dusty Road (So Kind)”, “My Whole Life Long” e “The Lake” transmitem tenha a ver exatamente com isso. O álbum soa familiar porque bebe de clássicos da folk, do rock, dos blues e da country: Bruce Springsteen, Bonnie Raitt, Muddy Waters, Van Morrison e James Taylor, entre muitos outros.

Silent Signs, o segundo e último álbum da banda, partilha algumas das características do primeiro. Os DeYarmond Edison levam-nos novamente a passear pelo Midwest e continuam a deixar-nos bastante confortáveis durante a viagem. “Bones”, “We” e “Heroin(e)” demonstram-no bem. Mas há algo diferente. Os silêncios prolongam-se, as canções são marcadamente mais acústicas e respiram muito mais. Soam mais graves, mais densas. Talvez seja o choque da sensibilidade pop de Justin Vernon com as tendências freak folk dos atuais Megafaun. Ou talvez seja a união e não o choque. Quem sabe?

Uma coisa é certa: Silent Signs tem uma identidade muito própria e as referências aos clássicos são muito mais esquivas neste álbum. Mas um certo experimentalismo acústico e as letras difíceis de interpretar (ainda que bastante longe da quase total ininteligibilidade a que Vernon nos habituou com Bon Iver) não retiram Silent Signs das águas folk navegadas pela banda. E há muitos bons momentos, como podem ouvir em “Silent Signs” (a canção), “Dash”, “Ragstock” e na já referida “Bones”. No entanto, “Lift”, que encerra o álbum, permite perceber que havia uma escolha de caminhos a fazer.

Isso torna-se ainda mais óbvio no EP sem título que os DeYarmond Edison ofereceram no MySpace quando anunciaram a separação. O anacronismo a capella de “Baby Done Got Your Number”, a megafauniana “Where We Belong” e a experimental “Finale” contrastam com a folk rudimentar de sensibilidade pop oferecida por “Song For A Lover Of Long Ago” e a belíssima “Epoch”, em que podemos encontrar alguns elementos que viriam a integrar o som de Bon Iver a partir de 2008.

O que Justin Vernon fez a partir de 2008 com os Bon Iver é melhor e mais relevante do que o que fez com os DeYarmond Edison. Mas é curioso que a música criada pela banda continue a soar tão bem nesta era pós-Bon Iver. Agora é fácil dizer que estava lá tudo, como é óbvio, porque o contexto fala por si. Mas sabem que mais? Estava lá tudo.