Os The National são uma das minhas bandas favoritas. E com todo o direito, devo acrescentar. Uma banda que lança, em cinco anos, álbuns como Alligator, Boxer e High Violet não merece senão a minha total dedicação.
É só por isso que arrisco dizer, com alguma pena mas sem me censurar por amor, que os The National se tornaram pouco excitantes. Se em Alligator explodiam por tudo e por nada e em High Violet nunca se permitiam libertar a tensão constante que envenenava quase todos os temas do álbum, em Trouble Will Find Me parecem ter-se transformado no sujeito coletivo de “Fake Empire”, a canção rainha de Boxer, a sua obra-prima. Em Trouble Will Find Me, os The National parecem andar por aí, a espaços, meio acordados.
Eles nada têm a provar. E é por isso que podem dar-se ao luxo de baixar a guarda e fazer um álbum assim, descomprometido. O tema de abertura “I Should Live In Salt” dá o mote, com o seu compasso que, à primeira audição, nos faz sentir como quando achamos que há mais um degrau na escada que estamos a subir. A letra, no entanto, traz de volta os The National que conhecemos… e à terceira ou quarta audição já estamos a adorar a música de uma ponta à outra.
A primeira amostra do álbum, “Demons”, confirma o estatuto de grower mas brilha pouco num álbum em que “brilhar pouco” é mais comum do que seria de esperar dos The National, como se pode confirmar em “Fireproof”, “Slipped” e a paradigmática “Hard To Find”, que fecha o álbum, que tem tudo o que os The National têm de melhor… mas que simplesmente nunca chega a arrancar a sério.
Felizmente, apesar de mais comum do que seria de esperar, esta meia luz não é regra. “Don’t Swallow The Cap” é The National de uma ponta à outra e “Sea of Love”, o primeiro single propriamente dito, é provavelmente a canção mais fresca e inesperada deste Trouble Will Find Me. Entre a densidade das guitarras e a letra esteticamente interessante (com destaque para a repetição de “Hey Joe, sorry I hurt you but / They say love is a virtue / Don’t they?”), “Sea of Love” assume-se facilmente como um dos grandes momentos deste álbum.
Com uma “Heavenfaced” que me divide (a segunda metade da música é muito interessante e baladeira, com belos arranjos de cordas e metais, mas a letra é supreendentemente fraca – “Can’t face heaven all heavenfaced”, diz ele; “She’s a griever, my believer / It’s not a fever, it’s a freezer”, diz ele) a fechar a primeira parte do álbum, a segunda parte não poderia começar melhor. “This Is The Last Time” é quase 5 minutos de The National no seu melhor, com aqueles nervos do costume e aquele twist final ao melhor estilo de “Cardinal Song”, essa pérola de Sad Songs For Dirty Lovers.
“Graceless” é noite e dia, escuridão e luz. Muito boa, sobretudo quando é mais luz que outra coisa. Aliás, seria pouco memorável se não fosse isso – mas é também graças a esse contraste que a música se transforma em algo mais. Estou em pulgas para a ouvir ao vivo.
A minha sequência favorita do álbum chega quase no final.
Começa com “I Need My Girl”, uma espécie de “Patterns of Fairytales”, 10 anos depois. É como um chocolate quente numa noite de inverno e vive de um grande, grande riff. Subtil, simples e adequado, como se quer dos The National. Perfeito, como se quer dos The National.
Continua com “Humiliation”, um dos picos de Trouble Will Find Me, toda escondida lá para o fim. Tão boa (aqueles pingos frios de piano), tão urgente (aquele baixo). A coisa mais hipnótica que os The National já lançaram.
E fecha com a fantástica “Pink Rabbits”, em que Matt Berninger, certamente farto de nos sussurrar aos ouvidos durante anos e anos, canta e canta e canta uns tons acima daquilo que estamos habituados a ouvir dele. Com uma letra destas, é como se tivesse nascido para cantar assim. Acaba por ser de uma emoção tão transparente que é quase estranho.
Trouble Will Find Me é o álbum mais difícil dos The National, isso parece-me óbvio. Independentemente da qualidade, este disco é um desafio bem maior do que qualquer um dos anteriores para quem o ouve.
O disco cresce e cresce a cada audição mas… nunca vai ser tão bom como Boxer. Ainda hoje o revisitei e percebi claramente isso. Não tem “Fake Empire”, “Mistaken For Strangers”, “Apartment Story”, “Racing Like A Pro”, “Gospel”… e por aí fora. Não é suficientemente coerente. Músicas como “Fireproof” não envergonham ninguém mas “não envergonham ninguém” não é propriamente um marco na carreira dos The National. E o resto do álbum acaba por ser prejudicado por estes apontamentos pouco relevantes.
Em suma, é mais um grande disco dos The National – mas não é maior que a vida. E era disso que eu precisava deles.
Vou ouvi-lo centenas de vezes e continuar a adorá-lo… mas tenho de ver se aprendo a lidar melhor com as expectativas.