O concerto no Coliseu foi um prémio que os Linda Martini já mereciam.
Ainda não tinha chegado ao Coliseu e já entretinha palavras como “triunfo” e “consagração” nos meus pensamentos. Independentemente da qualidade do concerto, os Linda Martini já tinham somado uma vitória: iam tocar no Coliseu de Lisboa. No mínimo, se forem muito modestos e desligados destas coisas, é um bom marco na carreira de uma banda portuguesa, mais ainda numa que navega pelos abrangentes terrenos do rock alternativo.
Mas foi mais do que isso. Os Linda Martini são uma máquina muito bem oleada em palco – não no sentido de perfeição técnica, mas de intensidade emocional. Eles sabem gerir um concerto. Eu, que já conto nove ou dez no lombo, posso testemunhá-lo. Mais ainda porque eles não têm conseguido agarrar-me com os álbuns (o meu disco favorito deles continua a ser Linda Martini, o primeiro EP). Ora, se os álbuns deles hoje em dia me dizem menos (deixando para já de fora Sirumba, que ainda não ouvi como deve ser), porque raio continuo a ir a concertos deles? Ora essa, porque são muito bons ao vivo.
Parecem putos. E ontem pareceram ainda mais do que o normal, provavelmente por estarem a pensar numa qualquer variação de “porra, estamos a tocar no Coliseu”. Pareceu-me ver ali uma certa alegria juvenil misturada com nervosismo, mas posso estar só a projetar preconceitos. Afirmo com mais segurança que André Henriques, Cláudia Guerreiro, Pedro Geraldes e Hélio Morais, alinhados lado a lado na frente do palco, se sentiam agradecidos. À família, aos fãs, à equipa que os apoia e a muitas outras pessoas, certamente. “Obrigado” foi, de resto, a palavra mais repetida ontem no Coliseu.
Mas e a música? Bem, a minha falta de familiaridade com Sirumba permite-me dizer-vos apenas que “Sirumba” e “Unicórnio de Sta. Engrácia” resultam bastante bem ao vivo, mas que não me senti especialmente atraído pelo resto das músicas que identifiquei (“Putos Bons” e “Dentes de Mentiroso”, por exemplo). Se é pela minha falta de familiaridade ou se é por não baterem certo com o que quero dos Linda Martini, não sei dizer-vos ainda.
De resto, brilharam as do costume. “Amor Combate”, “Juventude Sónica”, “Dá-me A Tua Melhor Faca” e “Mulher-a-dias” deram corpo ao set principal, onde também poderiam ter estado mas não estiveram “A Severa (Ver de Perto)” e “Lição de Voo nº 1)”, o que atesta bem a qualidade do cancioneiro dos Linda Martini. De resto, “Estuque” foi uma nota muito agradável no primeiro encore, mas foram “Belarmino vs.”, “O Amor É Não Haver Polícia” e “Cem Metros Sereia” a mandar a casa abaixo. Esta última – que fechou um dos três encores a que tivemos direito no Coliseu – já há muito se transformou n’a canção dos Linda Martini. Primeiro porque sintetiza a evolução que retirou à banda grande parte do “pós” ao pós-rock que lutava com o pós-punk para ver quem ocupava mais espaço em Olhos de Mongol. Depois porque “Foder é perto de te amar, se eu não ficar perto” é uma linha do caraças. Que o digam os milhares que a gritam a plenos pulmões em cada concerto dos Linda Martini, antes, durante e depois da música. Ontem não foi diferente – foi ainda mais intenso.
Não há melhor lugar que um palco para a urgência juvenil da música dos Linda Martini. A distorção das guitarras pede eco, a bateria e o baixo pedem palmas e saltos e cabeças bamboleantes e as letras pedem que as gritemos com eles. O facto de ontem o palco ter sido o do Coliseu poderia ser apenas um pormenor, mas não é. Eles são muito bons ao vivo, mas a noite de ontem foi diferente. Foi um triunfo. Foi a consagração da melhor banda portuguesa da última década.