You And I: nada de novo, nada de mau

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A mais recente edição póstuma de Jeff Buckley leva-nos por caminhos familiares.

Já passei pelas fases todas por que passa um fã de Jeff Buckley.

O mergulho, em que ouvi Grace de forma obsessiva vezes e vezes sem conta até me cansar. O cinismo, em que comecei a duvidar das intenções de Mary Guibert, mãe, guardiã do legado de Jeff Buckley e produtora de todas as edições póstumas, exatamente pela frequência elevada com que eram editados e reeditados discos dele. O desprezo, não por ele, mas pelas edições (mais especificamente So Real: Songs From Jeff Buckley, uma espécie de compilação, editada em 2007, de grandes êxitos – o que quer que isso seja quando se editou apenas um álbum em vida).

Agora, apercebo-me, estou naquilo que parece ser a última fase: a normalização. Sabia que não me esperava uma revolução quando ouvi falar do novo You And I, disco de demos gravadas em 1993, pela altura do lançamento de Live at Sin-é, a primeira edição de Jeff Buckley. Sabia que seria difícil ficar maravilhado com alguma coisa. Entre as Legacy Editions de Grace e Live at Sin-é, bem como The Grace EPsSketches For My Sweetheart The Drunk e os álbuns ao vivo, parece-me óbvio que a curta carreira de Jeff Buckley foi suficientemente coberta e visitada.

Mas, ao contrário do que aconteceria nos meus tempos de cinismo e desprezo, recebi a notícia com agrado. Nunca precisei de argumentos para revisitar Jeff Buckley, mas é sempre bom saber dele. Não deixa de ser estranho que um tipo que morreu há quase 20 anos se mantenha tão presente nas nossas vidas musicais, mas agora convivo bastante bem com isso.

Se estão minimamente familiarizados com a carreira de Jeff Buckley, You And I não traz conceitos novos para vocês. São demos – a maior parte delas de canções de outros artistas – e, como demos que são, não são produtos apropriados para consumo generalizado. É giro ouvir mais uma versão imberbe de “Grace” (a primeira gravada em estúdio), mas nunca nada bateu a versão final da canção. “Calling You”, originalmente interpretada por Jevetta Steele, e “Just Like A Woman”, de Bob Dylan, são bons docinhos, mas há muito tempo que as versões ao vivo da Legacy Edition de Live At Sin-éme conquistaram. É porreiro ouvi-lo tocar Sly & The Family Stone (“Everyday People”), Led Zeppelin (“Night Flight”) e The Smiths (“The Boy With The Torn In His Side” e “I Know It’s Over”, um clássico que pertence quase tanto a Buckley como à banda britânica), mas só se nunca tivermos ouvido Jeff Buckley é que You And I pode sobressair de alguma forma.

“Dream Of You And I”, meia canção, meia ideia em desenvolvimento para o que viria mais tarde a ser “You And I”, canção editada em Sketches For My Sweetheart The Drunk, o primeiro álbum póstumo de Jeff Buckley, simboliza na perfeição o estado a que as edições de Jeff Buckley chegaram. Ganhei noção, enquanto a ouvia, de que estava a ouvir a descrição musicada de uma ideia para uma canção futura. E qualquer dia dou por mim a ouvir álbuns que afinal são audiolivros de Jeff Buckley. Mas tudo bem.

Um disco novo de Jeff Buckley não é um disco realmente novo e dificilmente seria um disco de Jeff Buckley se ele estivesse vivo, creio. Mas – e é também aqui que me sinto normalizado – continua a ser uma belíssima viagem. Conhecemos tudo e estamos mais do que habituados à paisagem, mas o facto de tudo nos ser familiar não belisca a qualidade intrínseca do que lá está, apenas a nossa experiência. Se conseguirem esquecer-se disso por momentos, pode ser que consigam desfrutar do que You And I tem para oferecer.