O efeito dos atentados de Paris na indústria musical

Bataclan

Que consequências poderá ter o 13 de novembro para a música?

Os atentados de 13 de novembro em Paris vão deixar marcas profundas na Europa, tal como aconteceu com Madrid, Londres e, a outro nível, Nova Iorque nos últimos 15 anos. Mas o que aconteceu agora foi diferente, como se o objetivo não fosse matar o maior número de pessoas mas tornar claro que estas eram assassinadas enquanto dedicavam tempo a atividades de lazer perfeitamente banais como beber um copo com amigos, ir à bola ou assistir a um concerto.

Qualquer um de nós tem sentimentos e opiniões fortes sobre este acontecimento terrível, mas foquemo-nos na forma como o que aconteceu no Bataclan durante o concerto dos Eagles Of Death Metal está a ter efeitos práticos de vários tipos na indústria musical.

Primeiro, é importante perceber que morreram pessoas ligadas à indústria musical naquela noite. Pelo menos três funcionários da Universal Music francesa, bem como o gestor de merchandising dos Eagles Of Death Metal e um jornalista da revista Les Inrockuptibles. Não quero com isto dizer que estas vidas valem mais do que as outras que se perderam na noite de sexta-feira, como é óbvio. No entanto, se juntarmos a isto o facto de um dos alvos dos ataques ter sido um concerto de rock, é fácil perceber que a indústria da música – e particularmente a dos concertos – foi especialmente afetada e é normal que venha a haver consequências.

E as primeiras já se fazem sentir.

Como seria de esperar, os Eagles Of Death Metal, que conseguiram escapar com vida do Bataclan, cancelaram o resto da digressão europeia, incluindo o concerto que tinham agendado para o Armazém F, em Lisboa. A página da banda no Facebook não é atualizada desde essa noite. “Ainda estamos a tentar determinar a segurança e a localização de toda a nossa banda e equipa. Os nossos pensamentos estão com todas as pessoas envolvidas nesta situação trágica”, pode ler-se na última publicação da página.

Nas horas seguintes, os Foo Fighters anunciaram que também eles cancelariam os quatro concertos – entre os quais um em Paris – que faltavam para o fim da sua digressão europeia. A banda de Dave Grohl também recorreu ao Facebook para dar conta da notícia: “É com profunda tristeza e preocupação genuína por todos em Paris que fomos forçados a anunciar o cancelamento do resto da nossa digressão. À luz desta violência sem sentido, do fecho de fronteiras e do luto internacional, não podemos continuar agora.”

Também os U2 cancelaram os dois concertos que tinham agendados para os dias seguintes em Paris, mas garantiram que o concerto acontecerá. Bono Vox, The Edge e companhia passaram pelo Bataclan no sábado à noite para homenagearem as vítimas dos ataques e, pela voz de Bono, deixaram uma mensagem: “Esta gente não vai ditar a nossa agenda, não vai organizar as nossas vidas”. Mais concertos cancelados? Deftones e Motörhead, por exemplo. Alguns dos elementos dos Deftones, de resto, estavam no Bataclan naquela noite.

ColdplayTiago Bettencourt e presumivelmente todos os artistas que deram concertos por estes dias abordaram o assunto de alguma forma. Mas Madonna disse o que havia para dizer melhor do que ninguém.

Estes são alguns dos efeitos mais passageiros dos ataques de Paris (outro é ter a minha mãe a ligar-me para me pedir que nunca mais vá a um concerto), mas a pergunta que não me sai da cabeça é: haverá outros?

Deve haver muita gente a olhar para este acontecimento e a pensar “podia ter acontecido comigo”. Há quatro anos fui a Paris de propósito ver um concerto de Bon Iver. Podia ter acontecido comigo. Dan Auerbach, dos The Black Keys, publicou um artigo em que fala de como estava a dar um concerto com os The Arcs numa sala de tamanho semelhante em Paris, na mesma noite, à mesma hora. Podia ter acontecido com ele. Qualquer um de nós consegue pensar em pelo menos uma situação que leve à mesma conclusão.

E isto obriga a uma reflexão – que parece já estar em curso – sobre as melhores formas de garantir, tanto quanto possível, a segurança das pessoas que vão a concertos. A Live Nation, gigante do entretenimento norte-americana que detém mais de cem salas de espetáculos nos Estados Unidos, já anunciou que vai aumentar a segurança nas suas salas.

Entrevistado para um artigo do The New York Times, Gary Bongiovanni, editor da Pollstar, refere que “é apenas lógico que grandes salas de espectáculo por todo o mundo aumentem a segurança, mas a verdade é que há limites para o que se pode fazer para parar uma onda de atacantes suicidas”.

Os que se lembram das viagens aéreas pré-11 de Setembro – não é o meu caso – sabem o que mudou. Então os que, como o antigo embaixador português Francisco Seixas da Costa, se lembram de viajar de avião nos anos 70 sabem ainda melhor. Os ataques de Paris podem ser um ponto de viragem na forma como se trata a segurança de grandes eventos de lazer, como festivais, concertos ou jogos de futebol. Se a passagem por detetores de metais na entrada para um concerto vos parece uma imagem ridícula, é porque em parte é. Mas a verdade é que detetores de metais em sítios inesperados são mais comuns do que seria de esperar. Uma vez obrigaram-me a passar a mala por um num hotel, por exemplo. E o que vos posso dizer sobre isso é que, antes desse momento, o eventual risco de haver alguém a entrar com engenhos explosivos no hotel não me passava pela cabeça. E este é, de facto, o grande dilema: preferimos que Paris possa repetir-se, mesmo que a probabilidade seja ínfima, ou viver diminuídos e preocupados por medidas de segurança mais intensas?

Uma coisa é certa: as notícias que dão conta de medidas de segurança mais apertadas por parte de várias polícias já começaram a surgir e receio que possamos estar a seguir um caminho que nos vai levar a mais segurança e a menos liberdade.