Não conhecia Dan Mangan de lado nenhum. O raio do nome é estranhamente difícil de pronunciar e estou razoavelmente certo de que nunca me tinha cruzado com ele. Até que um dia a Arts & Crafts, a melhor editora do mundo, me enviou uma newsletter e tudo mudou.
Costumo estar atento às newsletters deles porque raramente editam um disco de que não goste. Vi lá uma referência a este Dan Mangan e lá fui eu para o YouTube investigar. Encontrei o vídeo oficial de “Robots”, um dos singles de Nice, Nice, Very Nice, e achei muita piada. Mas fiquei por aí durante umas semanas.
A determinada altura, não sei bem porquê, decidi ouvir o resto do álbum. Lembro-me de que o ouvi pela primeira vez no carro, o que não é muito habitual nem muito recomendável por causa do barulho e da má qualidade sonora. Mas foi o que aconteceu. Bastou uma qualquer noite de Outono e a voz de Dan Mangan entrou definitivamente para a lista de coisas a ouvir em repeat.
Nice, Nice, Very Nice começa bem. Começa com uma tensão que faz prometer algo que só a espaços aparece ao longo do álbum: libertação. Mas também parece prometer que o álbum é assim, tenso e meio rápido. Não é. Nada. “Road Regrets” é uma óptima canção mas um péssimo exemplo do que Dan Mangan reserva para nós ao longo dos 45 minutos de Nice, Nice, Very Nice.
“Robots” e o seu final épico também não são bons exemplos. Boa pop/rock, fácil de ouvir, com uma letra muito gira que acaba com “Robots need love too / They want to be loved by you” (o que, não sendo propriamente um dos melhores momentos do álbum no que às palavras diz respeito, é claramente impossível de tirar da cabeça nos primeiros dias)… enfim, foi esta a música que me trouxe até aqui.
E depois disto, o que resta? A folk – possivelmente da melhor que já saiu do Canadá (e digo isto sem qualquer espécie de fundamento, como é óbvio). Querem coisas calmas? Então “The Indie Queens Are Waiting” é para vocês. Preferem pensar em grandes jantaradas regadas a álcool no meio de uma quinta qualquer? Então é melhor ouvirem “Sold”. Estes são dois bons exemplos do que podem ouvir no álbum… mas a mim interessam-me as excepções.
“Fair Verona” foi o meu primeiro grande amor neste disco. Sempre calma, sempre a prometer pouco. Até que, depois de nos convencer de que nada mais há do que aquele andamento ligeiro, aquela melodia doce regada a cordas… a coisa acalma uma última vez. Depois, acho que nem consigo explicar. Tudo cresce nesta música: as frases, a bateria, os metais, a voz, tudo. “To them, we’ll be has-beens / To them, be rogue waves / To them, be lost trains / Just posers posing” é, sem sombra de dúvida, o ponto mais alto de Nice, Nice, Very Nice. É uma daquelas coisas a que não há como escapar. E aquele trompete (acho) irado no final acaba com o pouco que resta de nós. Que música.
A coisa volta a acalmar nas músicas seguintes – “Tina’s Glorious Comeback”, por exemplo, demonstra mais uma vez o jeito de Dan Mangan para as palavras – mas ainda há mais cavalgadas e ih-ah!’s em “Some People”, uma canção que conta com a colaboração de Mark Berube na voz.
Não consigo deixar de pensar que “Pine For Cedars” é uma partida. Tanta melancolia, tanta beleza, tanta perfeição juntas numa música tão curta quase parece desperdício. Parece construída à base de amostras. Um bocadinho de guitarra perfeita, um bocadinho de estrofe perfeita, um bocadinho de bateria perfeita, um bocadinho de letra perfeita, um bocadinho de voz perfeita… um bocadinho de tudo perfeito. Mas é só um bocadinho, lá está. Felizmente, não sabemos o que está para vir.
Só há uma música capaz de rivalizar com “Fair Verona” neste álbum. Essa música chama-se “Basket” e é a prova viva de que um homem e uma guitarra às vezes bastam. A letra é simplesmente fenomenal e fala de amor e da memória, da idade e da resiliência. Também fala de um puzzle e de um cão mas a coisa é mais profunda que isso. Não sei se consigo pôr em palavras o que esta música faz. Mas envolve arrepios. Ora vejam lá se não tenho razão…
E a coisa para mim acaba aqui. Raramente consigo ouvir a última música, também ela bastante bonita. Depois de “Basket”, o piano de “Set The Sails” já não me chega.
Nice, Nice, Very Nice é um álbum fantástico. É coeso mas todas as músicas funcionam bem individualmente. A voz de Dan Mangan é rouca e um pouco grave, o suficiente para não passar despercebida. Seria um dos álbuns do ano… se a edição original fosse deste ano. Não é, é de 2009. Mas este álbum vulgariza grande parte dos que foram lançados este ano. É uma pena. Felizmente, música desta não precisa de data.