Art Angels: o monstro pop de Grimes

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A melhor pop de raízes electrónicas dos últimos anos tem agora um nome maior do que qualquer outro: Grimes.

A canadiana Claire Boucher habituou-nos a esperar o melhor. Adoravelmente esquisita, Grimes tem-nos dado ossos bem interessantes de roer desde o início. Se Geidi Primes Halfaxa tinham muito de esquisito e pouco de pop, a balança equilibrou-se com o lançamento de Visions, o aclamado álbum de 2012 que acabou por lhe valer um Juno Award (e uma nomeação adicional), a nomeação para o Polaris, que é atribuído ao melhor álbum canadiano do ano, e um lugar de topo em imensas listas no final de 2012.

É, portanto, normal que se tenha gerado imenso hype à medida que se aproximava o lançamento de Art Angels, o novo álbum de Grimes. Primeiro, porque até há poucas semanas ninguém sabia quando seria lançado. Depois, porque quando “Flesh Without Blood” chegou, ficou tudo maluco. Se o primeiro single podia dar algumas indicações, então haveria bons motivos para a loucura. É simplesmente uma das melhores canções do ano.

E agora que Art Angels já por aí anda?

A resposta curta é: parece que o álbum é mesmo muito bom.

A resposta longa? Art Angels é o álbum mais pop que Grimes lançou. Não é inesperado, tendo em conta o caminho percorrido até hoje, mas não deixa de ser interessante. É que um álbum assim tem tudo para fazer com que Grimes abandone definitivamente o estatuto de artista de culto e comece a voar bem mais alto.

Canções como “California”, “Artangels”, “Butterfly”, a já referida “Flesh Without Blood” ou a gigante “Kill V. Maim” são dos temas com mais potencial de conquista de novo público que Grimes já editou. E desde que soube que “Kill V. Maim” é escrita na perspetiva de Al Pacino em O Padrinho: Parte II (mas com algumas características adicionais interessantes: é um vampiro que troca de género e viaja pelo espaço), eu cá fiquei conquistado.

Grimes consegue dar-nos um álbum que tem, ao mesmo tempo, batidas cheias de tesão e uma previsibilidade confortável que permite que nos concentremos nas canções. Porque Art Angels é um álbum de canções cujo instrumento principal – a voz – se desdobra em camadas cheias de efeitos e em funções secundárias, como em “Pin” e “Realiti”, ao mesmo tempo que brilha lá na frente, por cima das melodias viciantes e facilmente decoráveis. E os apontamentos de sintetizadores e guitarra só ajudam a tornar o álbum maior – porque os próprios pormenores canalizam o espírito grandioso das canções, seja em sessões de para-arranca que nos deixam sem apoio, seja nos grandes refrães em que parte tudo para o ataque.

Art Angels tem os seus momentos mais calmos, como a estranha “laughing and not being normal” a abrir, “Life In The Vivid Dream” ou a viciante “Easily”, e momentos mais extravagantes, como “SCREAM” ou “Venus Fly” (que conta com a participação de Janelle Monáe)… mas é no meio da pop perfeita que está a grande virtude do álbum. E apesar de estar mais longe dos falsetes que sempre materializaram um lado mais psicadélico na sua música, a voz de Grimes parece cada vez mais flexível e abrangente, o que vem mesmo a calhar nesta nova etapa.

E que etapa é esta? Uma etapa que promete dar-lhe mais notoriedade, mas que pode, além disso, contribuir determinantemente para uma nova vida da pop. É que a tal esquisitice que tem acompanhado a carreira de Grimes não desapareceu – foi integrada em Art Angels e promete fazer estragos. Dos bons, claro.