Não é nenhum Boxer, mas…

Deixem-me tirar isto do caminho: o melhor álbum dos The National chama-se Boxer, foi editado em 2007 e tudo o que eles fizeram desde então implicou, de uma forma ou outra, correr atrás do prejuízo. Pronto.

Foi neste belo estado de espírito que recebi I Am Easy To Find, oitavo álbum de originais da banda norte-americana, em maio. Trouble Will Find Me e Sleep Well Beast foram certamente vítimas do mesmo estado de espírito – porque é que o novo disco haveria de receber tratamento diferente?

Apesar de tudo, parto para qualquer música nova dos The National com a confiança de que será boa. E normalmente é. Não me faltam canções deles guardadas junto ao peito, mesmo dos álbuns mais recentes.

Não é nenhum Boxer

Desenganem-se se acham que I Am Easy To Find seguiu um caminho diferente dos outros. Está bem que houve a estranheza inicial de ouvir vozes femininas em destaque durante canções inteiras de uma banda que tem no barítono de Matt Berninger a sua característica mais marcante. Ainda assim, a determinada altura cheguei à conclusão a que tenho chegado nos últimos anos: é um bom álbum, mas não é nenhum Boxer.

Sei que não é muito correto, mas deixem-me pôr aqui um “mas” a seguir ao “mas” do último parágrafo: mas depois há “I Am Easy To Find”, a música que dá nome ao álbum.

Há temas que brilham muito mais, como “You Had Your Soul With You”, “Oblivions” ou “Light Years”. E os The National andam a fazer isto desde Alligator. “Daughters Of The Soho Riots” era ofuscada por “Abel”, “Mr. November” e “Secret Meeting”. Ninguém se lembra de “Gospel” num álbum com “Fake Empire”, “Apartment Story” e “Mistaken For Strangers”. Mas também há “Runaway” em High Violet, “Humiliation” em Trouble Will Find Me e “Dark Side Of The Gym” em Sleep Well Beast.

Como disse, os The National andam a fazer isto desde Alligator. Dão-me sempre um pedacinho mais discreto de música que acaba comigo lentamente, como se eu fosse um pequeno sapo num inconspícuo (para um sapo, pelo menos) panelão de água em cima de um fogão.

Intervalo para descansar?

Em Boxer, com “Gospel”, e em Trouble Will Find Me, com “Hard To Find”, as canções fecham os álbuns com um longo suspiro final. Aqui, o suspiro surge sensivelmente a meio, como quem pede um intervalo para descansar. Mas é tão enganador.

“I Am Easy To Find” cheira a agitação e àquele desesperozinho bom, mas não sai do sítio. A personagem central da canção certamente justifica o título, com versos como os desta feliz sequência:

I’m not going anywhere
Who do I think I’m kidding?
I’m still standing in the same place where you left me standing

Mas este “cá estamos” abrange também a própria música, que parece mover-se em círculos muito fechados. Piano, sintetizadores e as vozes de Matt Berninger e Kate Stables, também conhecida como This Is The Kit, fazem de “I Am Easy To Find” uma canção de embalar relativamente tensa e, sobretudo, muito bonita.

Quando a bateria entra a meio do último refrão e já quase no final da canção, é como se viesse libertar-me e enchesse de luz uma cave pela primeira vez desde sei lá quando. Quase sinto as pupilas a ficarem mais pequenas.

Continue eu à procura

Mas a espiral de vozes final leva-me de volta ao início e assim vou escavando mais um bocadinho a cada repeat, a cada pormenor descoberto.

“I Am Easy To Find” nunca vai brilhar tanto como as outras. Há muito tempo que os The National são demasiado grandes para que uma canção tão subtil como esta se destaque. É curioso: lembro-me de sentir uma qualquer variação disto com “Gospel”, em Boxer, mas o resto do álbum enchia-me absolutamente as medidas. Em 2019, no entanto, “I Am Easy To Find” cumpre discretamente a função de me recordar que os The National continuarão a dar-me música para guardar junto ao peito, continue eu à procura. Até agora, tem sido fácil de encontrar.