O Presidente da República vetou a lei da cópia privada, devolvendo o diploma à Assembleia da República para que os deputados possam reponderar os diversos interesses em causa e trabalhar em legislação mais adequada à evolução tecnológica e à proteção dos direitos dos autores e dos consumidores.
Estou tão surpreendido como vocês.
As alterações à lei da cópia privada, que já tinham sido aprovadas pela maioria PSD/CDS-PP há mais de um mês, visavam estabelecer taxas entre os 5 cêntimos e os 20 euros em produtos como discos rígidos, leitores de MP3 e telemóveis para compensar autores por sabe-se lá o quê. A minha opinião sobre o assunto é clara: sou contra. Não tenho problemas com taxas de solidariedade mas é bom que façam sentido… e esta não faz.
Motivos para o veto
Porque é que Cavaco Silva decidiu devolver o diploma à Assembleia da República, contra todas as expectativas?
Resumindo, há quatro grandes motivos:
1. Falta equilíbrio entre os diferentes interesses em causa (autores vs. consumidores, por exemplo);
2. É necessário procurar uma regulação comum a todos os países da União Europeia para evitar disparidades que levem os consumidores a comprar noutros países o que poderiam comprar em Portugal;
3. Importa ter em conta o feedback dado por associações de consumidores como a DECO, que levantaram uma série de questões importantes relativamente ao diploma;
4. Há dúvidas sobre se faz sentido taxar equipamentos assumindo que vão ser utilizados de determinada forma, independentemente de isso acontecer ou não.
O último ponto é especialmente relevante para mim, já que se assume que qualquer pessoa que compre um telemóvel ou um tablet, por exemplo, vai fazer uma cópia privada de uma obra protegida pelo direito de autor. É injusto e não faz sentido, pelo que é – e nunca pensei dizer isto – uma excelente decisão de Cavaco Silva.
E agora?
Ainda não deu para perceber o que vão fazer o Governo e a Assembleia da República sobre este tema mas parece-me que há três opções:
1. A maioria PSD/CDS-PP pode tentar avançar com a lei à mesmaexatamente nestes moldes se conseguir obter uma maioria reforçada na Assembleia da República, o que neste caso significa apenas a chamada maioria absoluta (metade dos deputados da Assembleia mais um). No entanto, Luís Montenegro, líder parlamentar do PSD, apesar de remeter a comunicação da posição do partido para mais tarde, refere que o PSD respeita a decisão de Cavaco Silva, o que dá a entender que não tencionam forçar a promulgação da lei como está. As declarações de Teresa Anjinho, deputada do CDS-PP, vão no mesmo sentido.
2. Com a devolução do diploma à Assembleia da República, pode ser que os deputados decidam ir ao encontro do feedback dado pelo Presidente da República, trabalhando numa nova proposta que tenha em conta os motivos apresentados ou que siga um caminho totalmente distinto.
3. Parece-me a hipótese menos provável mas é sempre possível que a maioria PSD/CDS-PP abandone a proposta. Isto não significa que uma variação da lei da cópia privada não venha a surgir mais tarde, nomeadamente pelas mãos do PS, que também já demonstrou interesse em avançar com uma lei semelhante no passado.
Ainda é cedo para perceber o que vai acontecer mas é certo que o veto de Cavaco Silva é uma boa notícia. Não me parece que o assunto vá ficar por aqui mas, infelizmente, temo que o ruído feito por entidades como a SPA e a Agecop e uma certa falta de predisposição da Assembleia da República para ouvir os eleitores continuem a prejudicar uma discussão mais séria do assunto.